Não tem como esconder Midas, o rei da Frígia, era aquele sujeito atrapalhado que ousou afirmar que a flauta tocada pelo sátiro Marsias era muito mais melodiosa que a harpa tocada por Apolo, o deus da música. Furioso com a afronta, Apolo fez as orelhas de Midas crescerem, longas e peludas, até se transformarem em legítimas orelhas de burro; para ocultá-las, o rei enfiou na cabeça um daqueles barretes vermelhos que os camponeses frígios costumavam usar. Ao cabo de um ano, contudo, o seu cabelo tinha crescido tanto que ele teve, muito a contragosto, de convocar um barbeiro ao palácio. Com um ar ameaçador, Midas conduziu-o a uma peça sem janelas e aferrolhou a porta por dentro. Quando removeu o barrete e as longas orelhas ficaram à mostra, o barbeiro, porém, começou a trabalhar com suas tesouras como se nada estranhasse. Ao terminar, Midas avisou-o de que aquilo tudo era segredo de Estado; se contasse a alguém, o carrasco real ia separar sua cabeça do corpo - ao que o barbeiro, aparentando indiferença, retrucou: "Não sei do que Vossa Majestade está falando; eu nada vi nesta sala que já não tivesse visto antes". O rei ficou tão satisfeito com a resposta que pagou-lhe o corte cem vezes mais do que valia, e o barbeiro saiu do palácio com as pernas bambas, percebendo que tinha estado muito perto da própria morte. Pouco a pouco, o segredo tornou-se tão insuportável que ele acabou ficando ainda mais infeliz do que Midas. Precisava contar a alguém, dividir esse peso, aliviar sua mente, mas temia ainda mais a espada do carrasco e continuou a sofrer, até que teve uma súbita inspiração: afastou-se o mais que pôde da cidade e lá longe, numa curva deserta do rio, cavou um buraco na margem, ajoelhou-se na areia úmida e sussurrou, três vezes: "Midas tem orelhas de burro!". Depois, aliviado, repôs a terra cuidadosamente, cobrindo assim as perigosas palavras que tinha proferido, e afastou-se em silêncio. Mas bem ali, naquele ponto, nasceu uma touceira de juncos, que, na primavera seguinte, quando o vento agitava suas hastes flexíveis, repetiam o segredo que tinha sido confiado à terra: "Midas tem orelhas de burro!" - e o vento espalhou o segredo pelos campos, e os campos o repetiram para os cascos dos cavalos que passavam por ali, na direção da cidade, e a cidade o repetiu nas esquinas, nas feiras e no mercado, até que todos os habitantes do reino se inteirassem da notícia. Midas foi um grande tolo, como tolo é o governante que pensa que pode ocultar, com dinheiro e ameaças, as suas orelhas de burro, pois, bem mais cedo do que ele pensa, o vento trará à cidade os segredos e as verdades que ele tenta em vão esconder.
|